Quem pega ônibus sabe que presenciamos bons e péssimos exemplos de motoristas — exemplos que não quero imitar, nem no simulador de ônibus. Hoje não pude reclamar, fui e voltei no meu chassis preferido. Porém, fui também do bom ao mau exemplo de motorista.
Fui numa viagem pachorrenta e calma, a bordo de um Torino 2007 – VW 17.230 EOD com o motorista tranquilo e paciente das 7:30am. Depois de dar uma viagem de balde até minha faculdade, fui andando pelo meu caminho de roça no comércio até chegar ao “batlugar” na praça Cairú para esperar minha carona paga. Não precisei esperar muito, pois logo chegou o motivo desta crônica. Subi e percebi que seria uma viagem adrenalínica, pois encontrei meu antigo motorista que me apanhava às 6:00am e com quem tive episódios bem toscos no trânsito. Hoje sua tosquice foi com a caixa de marcha, o que detectei assim que subi. Esse homem passou cada marcha de um jeito único, dotado de um estoicismo sem igual. Entre cada pico de velocidade, solavancos e acionamentos do freio de motor, a caixa de marcha parecia implorar por um final feliz. Visto que sou um apaixonado por ônibus, fico muito chateado quando vejo alguém descontar suas mágoas e problemas numa máquina inocente.
Como se já não bastassem seus anos de sofrimentos diários, no seu fim de carreira nosso guerreiro de quatro rodas teve que aguentar os austeros comandos de um algoz capataz disfarçado de motorista. Pude sentir cada violenta passada de marcha – sim, eu fui empático com uma máquina.
Fiquei pensando se aquele infame, estivesse montado num cavalo de verdade, o quanto tal bicho sofreria debaixo de suas impiedosas chibatadas sendo forçado a levar um autero e arrogante dono. Que bom que máquinas não possuem sistema límbico – o que me deixa aliviado.
Guardei seu número de ordem e seu modelo: um imponente Busscar Urbanuss Pluss – VW 17.230 EOD, 10251 CSN. Se o vir pela rua, saiba que ele é um sobrevivente, um “Mangalarga Machador”, um Cavalo de Quatro Rodas.
Escritos Repentinos 